16 de fevereiro de 2019, 6h31
Por Eduardo Lourenço Gregório Júnior
A discussão travada na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.553, na qual o Psol questiona incentivos fiscais concedidos a determinados defensivos agrícolas, nos traz a necessidade de relembrar alguns conceitos que envolvem a tributação e apartá-los de questões outras. É separar alhos dos bugalhos.
Os incentivos fiscais objetos da ação são de redução da base de cálculo do ICMS, por meio do Confaz, e de isenção do IPI. O Psol suscita a inconstitucionalidade por supostas violações ao direito fundamental ao meio ambiente equilibrado, ao direito fundamental à saúde e, ainda, pela seletividade tributária.
Inicialmente, registre-se que a própria autora da ADI reconhece, no panorama geral, que há uma imensa burocracia de validação e revalidação para uso dos produtos no Brasil. Este ponto nos parece ser muito mais um argumento para que o Supremo Tribunal Federal mantenha como prega a doutrina neoconstitucionalista, a deferência à administração pública, especialmente pela capacidade técnica que esta possui para avaliar os efeitos dos defensivos agrícolas.
Até porque, se foi autorizado o uso do defensivo agrícola, nos termos aprovados pelos órgãos competentes, o que o Supremo poderá dizer? Que o benefício tributário é o fator que faz o defensivo ser prejudicial? Ou, então, ser mais caro quer dizer que não fará mal?
Aliás, o argumento econômico não se sustenta. É o desconhecimento do setor, uma vez que os defensivos agrícolas são produtos muito caros e os benefícios não os fazem ser “baratos” a ponto de aumentar o uso. Chega-se a afirmar que os benefícios não devem ser concedidos, uma vez que teriam o condão de aumentar o uso dos defensivos agrícolas (e que isto seria prejudicial).
É tanto quanto óbvio que majorar a carga tributária da cadeia produtiva aumentará o preço do produto final, no caso, alimentos (ainda que exportados), que possuem direta influência na inflação (e na balança comercial). Os benefícios concedidos aos defensivos agrícolas não beneficiam as indústrias, mas, sim, o agronegócio e a economia brasileira, fazendo com que o produto brasileiro seja competitivo internacionalmente e que haja farta oferta de produtos alimentícios, e a baixo custo.
Ainda é feita uma correlação entre essencialidade e capacidade contributiva e uma confusão entre os institutos de incentivo fiscal e seletividade. E, por isso, devemos retornar às lições introdutórias de Direito Tributário, pois é por esta perspectiva que a matéria será julgada.
Benefício fiscal e seletividade não se confundem, tampouco se misturam na análise da viabilidade de uma isenção.
A seletividade é uma regra geral e serve para graduar as alíquotas de acordo com a essencialidade dos produtos, ou seja, quanto mais supérfluo o produto, maior deve ser a sua tributação. Incentivo fiscal, da qual a isenção é uma modalidade, é uma regra infraconstitucional de desoneração, que pode ser concedida nos termos da Constituição e do CTN, por decisão discricionária do governo.
Isto é, o governo, por intermédio do Poder Executivo, pode ter razões extrafiscais de política governamental que não guardam relação com seletividade e que são absolutamente discricionárias para conceder o incentivo. Caso contrário, para que governo? Não se pode amarrar o campo de atuação do Estado de tal modo que sejam engessadas políticas governamentais.
O próprio Supremo já reconheceu que a “concessão de isenção é ato discricionário, por meio do qual o Poder Executivo, fundado em juízo de conveniência e oportunidade, implementa suas políticas fiscais e econômicas e, portanto, a análise de seu mérito escapa ao controle do Poder Judiciário” (RE 344.331, min. Ellen Gracie, 4/3/2003).
Espera-se que o Supremo mantenha a discussão proposta na ADI com base nos institutos tributários, pois é disso que se trata.
FONTE: CONJUR
Eduardo Lourenço Gregório Júnior é sócio do Maneira Advogados e secretário-geral da Comissão de Assuntos Tributários da OAB-DF.